Prevenção e luta contra as dependências

10-02-2012 14:13

Todos os anos são investidos milhões na chamada luta contra a droga. Todos os anos se fala do flagelo do álcool. Dificilmente se fala ou investe igual quantidade nas outras adicções, como adicção ao trabalho, à comida, às compras... e tantas outras que não se colocam como miséria social. A primeira pelo crime envolvido, a segunda pelos desastres na estrada, volência doméstica e morte prematura associados.

Morrem homens na guerra contra os cartéis de droga, perseguem-se traficantes, apreendem-se surpreendentes quantidades de narcotrafico, apenas para desparacerem num lado para aparecer do outro.

Ouve-se mesmo dizer: "Enquanto os produtores e traficantes tiverem lucro, haverá sempre vítimas da droga."

Esta lógica perde-se quando o álcool é de venda livre, o que nesse caso já não se explica pelo enriquecer de criminosos. Sendo os produtores de vinho considerados produtores de prestigiadas castas.

Esta lógica ainda se dilui mais na adicção ao trabalho.

Em resumo: O facto de vivermos numa cultura que atribui como medida para quase todos os males a punição. É difícil ver além do crime e castigo.

Mesmo o alcoolico vive desgraçado por sua culpa, como castigo por se descontrolar.

E quanto aos outros adictos "têm o que merecem".

É como se fazer-se justiça de alguma forma resolvesse alguma coisa.

Funcionou até agora?

Não.

Vale a pena continuar então a fazer a mesma coisa?

...

Claro que é importante desmontar estruturas criminosas. Mas entre lutar contra o crime e lutar contra as adicções vai uma enorme distância. E é isso que não tem sido tido em conta.

As fortunas colossais investidas no combate ao narcotráfico procuram desmontar uma espécie de sociedade paralela, com regras próprias nas quais os líderes o são pela força, numa política de terror e crime.

Mas os adictos, esses nada têm a ver com isso. Não vão ficar curados sempre que um traficante é preso.

Para os adictos, na realidade não é preciso gastar um tostão, sequer.

Existem dois tipos de pessoas que ajudam realmente a resolver o problema da adicção do ponto de vista do adicto:

A família berço, e os adictos em recuperação através do 12º passo.

Não é irónico?

A família berço previne. Previne em tenra idade valorizando a criança, dando respeito, carinho, verdade, liberdade, limites, consideração, estímulos sociais e emocionais...

A família berço contribui para as adicções através da crítica directa ou subtil, do desrespeito, da omissão de verdades, da falta de consideração, da comparação com outras crianças, da pressão para o desempenho nas notas, nas actividades, na apresentação, nas condutas sociais...

A família berço vai embutir na criança até aos 6 anos a forma como ela se vai ver a si mesma e amar a si mesma. O olhar que lhe é deitado até essa idade é o olhar que deitará a si mesma. Para o bem, e para o mal. Pode aceitar-se e apostar em si mesma. Ou pode criticar-se e punir-se a si mesma. A família de berço escolhe.

 

Os adictos em recuperação, no 12º passo, fazem serviço levando os passos ao adicto que sofre. O próprio Bill e o Bob, que sistematizaram os Álcoolicos Anónimos foram eles mesmos adictos em recuperação. Dos AA nascerem os NA, CODA, e também enormes especificidades como comedores compulsivos anónimos, trabalhadores compulsivos anónimos etc...

São os adictos em recuperação que levam a esperança, que oferecem um grupo de identificação e crescimento no qual o adicto encontra a compreensão, o grupo de apoio, o apadrinhamento, e o poder do grupo que, à falta de outro, pode ser o poder superior.

Estes grupos anónimos não são para quem precisa. São para quem quer. É por isso que o primeiro passo é a aceitação da ingovernabilidade da sua vida. Seguida do segundo em que percebemos que não temos mão sobre as nossas escolhas. E no terceiro que alguém nos vai ajudar.

 

Assim, as autoridades gastam dinheiro punindo, perseguinto, encarcerando, multando, e fazendo todo esse trabalho perigoso, que pode ser considerado uma guerra.

As famílias e os adictos em recuperação fazem o trabalho de prevenir e de apostar na recuperação através de passos e tradições, o que pode ser considerado uma aposta no amor.

A guerra custa dinheiro.

O amor é de graça.

A guerra não vai acabar com traficantes que lucram com a miséria dos outros, enquanto houver "outros", e lucro e tráfico.

Mas a recuperação é que pode desmontar realmente todo este universo violento, doente e causador de um massacre de proporções mundiais, epidémicos, causadores da ceifa de uma quantidade incontável de vidas e desgraça. A recuperação vai de dentro para fora.

A recuperação, já aqui foi dito neste site muitas vezes, é uma doença de vida. Não basta ficar abstémio, deixar de consumir ácool mas manter a vida toda na mesma é continuar álcoolico a seco.

Da mesma forma, à escala social e mundial, é o conceito de vida, de humanidade e de direitos humanos que precisa de ser alterada. Caso contrário temos uma sociedade adicta, na qual continuará sempre a proliferar o consumo consequente.