A dependência e a moral... ou falta dela

14-04-2010 10:10

Algo que aumenta o fosso entre o dependente e o mundo onde se insere, é o facto de muitos dos seus sintomas se confundirem com dificuldades de comportamento ou de carácter.

Seja qual for a dependência o adicto fez uma troca. Objectos tornaram-se pessoas e pessoas tornaram-se objectos.

Claro que não é uma substituição assumida nem consciente, mas a lógica é a seguinte:

Perante uma necessidade emocional, os objectos são previsíveis, controláveis e as pessoas não.

Além disso, alguns objectos conseguem, pelo menos por momentos fazer-nos sentir bem, mesmo quando nos sentiamos mal.

Ainda mais é possível, durante algum tempo, manter uma sensação de bem estar com base nesse objecto controlável e se for muito disponível ainda melhor.

Ao descobrir estas três verdades sobre os objectos da sua adicção o dependente cria com estes uma relação de intimidade que na realidade é de intensidade, mas que se confunde com intimidade.

Ao fazê-lo, retira a intimidade da sua relação com as pessoas e passa a usá-las no que for necessário para poder manter a sua relação de intimidade, ou seja de intensidade, com o objecto da sua adicção.

Confuso?

Aposto que é.

No livro: A personalidade aditiva, esta é uma das chaves para compreender a dependência na sua génese. É algo que se aplica a todas as dependências.

Não existe uma moral ou falta de moral nesta manipulação das pessoas nem no facto de passar as pessoas para segundo plano enquanto a dependência se torna a coisa mais importante. Existe sim, um sintoma de doença. Uma doença chamada adicção.

É muito importante para o adicto compreender que pode conseguir distinguir a diferença entre intimidade e intensidade, e é muito importante começar a construir relações de intimidade com amigos, envolver-se num sentido comunitário de serviço, estabelecer uma relação com a sua espiritualidade seja ela qual for, e sobretudo, criar uma relação de intimidade consigo mesmo.

Muitas vezes porém, o adicto cria relações com outros adictos, às quais atribui intimidade, quando na realidade o que existe é a intensidade de uma adicção em comum. Retira-se o objecto de adicção e tudo perde o colorido e aquelas pessoas passam a ser desconhecidos, que na realidade sempre foram.

O adicto é só.

É rodeado de pessoas/objecto e relaciona-se com um objecto que passa a ser o centro da sua personalidade aditiva, mas não do seu lado saudável que em recuperação tem a capacidade de construir finalmente relações duradouras com fontes reais de estabilidade e qualidade de vida emocional.