Amor e ser pessoa

08-06-2010 19:34

 Desde que nascemos que fundamentalmente, precisamos de amor. Para sobreviver precisamos de alimento e de alguns outros elementos puramente orgânicos, mas para sermos pessoas, precisamos de amor mais ainda do que de alimento.

Essa forma de amor que aprendemos dos nossos primeiros meses e anos, desde a gravidez à entrada para a escola, molda a forma como iremos amar e ser amados por toda a vida, excepto se alterarmos esse padrão, com bastante tenacidade e persistência, uma vez conscientes deste processo.

Para muitos pais é óbvio que amam os seus filhos. Dirão mesmo que os amam acima deles mesmos, mais do que as suas próprias vidas. No entanto ninguém pode dar o que não recebeu, nem pode saber o que nunca aprendeu, e se não fomos amados com um amor abnegado, saudável, e feliz, simplesmente não temos isso para dar.

São já numerosos os estudos que nos demonstram que o amor dito incondicional é simplesmente uma pérola, uma raridade.

Podemos dizer que a esmagadora maioria das crianças nasce e cresce em formas de amor imaturas, com pessoas que estão muitas vezes nos primeiros passos da maturidade emocional, por mais bem sucedidas que possam parecer noutros aspectos.

Amor limpo e amor livre, é um amor que expande e liberta, que dá espaço, que valoriza o que existe, que não passa mensagens mais ou menos sublineares de que não somos suficientemente bons, ou de que precisamos de nos esforçar para merecer demonstrações de amor.

Amor incondicional, é um amor que deixa ser cada um como é, e apenas promove ferramentas de potenciação da natureza sagrada de cada um.

A esmagadora maioria das crianças não terá isso. 

Nenhum adulto é adulto sem ter sido essa criança que não teve esse amor incondicional.

A maioria das pessoas cresceu, cresce e crescerá com um défice de demonstrações de afecto gratuitas, com valorização incondicional e com investimento amoroso e entusiasta sobre as suas características e pequenas grandes conquistas enquanto atravessa o nascimento e os seus primeiros anos de vida.

Com a ideia de que educar é moldar, retirar comportamentos indesejáveis e premiar comportamentos desejáveis, damos boas razões às crianças para decidirem que têm aspectos errados, que estão como que avariados e que precisam de arranjar máscaras que façam parecer que se adequaram.

Adultos são conjuntos sofisticados de máscaras que caiem em situações limite, mas que servem no dia a dia para tornar a vida suportável.

No entanto o ser autêntico não morre. Fica ali transformado em sombra e aparece aqui a ali nas nossas iras, compulsões, e comportamentos inexplicáveis.

Ser pessoa é já estar completo. Como dizia a frase tão bonita: Os teus filhos, não são teus, são filhos da vida.

Quem de nós aprendeu que era filho da vida, e que já era completo e uma obra sagrada da vida, e que era amado incondicionalmente?

Quem de nós aprendeu que amar é gostar de ver o outro ser livre?

Quem de nós aprendeu que amar é dar ao outro a liberdade de ser exactamente quem é, como é?

Quem de nós foi ou é amado assim?

Amor e sofrimento, são a aliança da cultura romântica na qual gerações crescem a acreditar que amor é sacrifício, que amor é sofrer, que amar o outro pode alguma vez ser incompatível com amor próprio.

 

Na realidade amar sem amor próprio, é amar sem se ser completamente pessoa plena, autêntica, viva e cheia de generosidade. Ter para dar, implica receber para ter. 

Quando damos, damos, damos... sempre na mesma direcção, sem o retorno da gratidão, do amor mútuo, do espaço e da liberdade que como ser precisamos para viver,não é amor, é doença.

A doença de que mais se padece por essas casas todas, famílias, cidades, janelas de prédios.

 

Amar e ser pessoa, são aprendizagens do berço ao bacio. É nessa altura que se aprende o que é ser respeitado, ser amado com calma, com abertura e alegria.

Quem não teve isto, e quase ninguém teve, precisa de re-aprender. E isso não é vergonha, é esperança. Esperança de que afinal há outra forma.

Aliás esta forma de viver, nunca o foi.